Enf. Paula Carvalho - reflecções na vivência com as taças de som

O meu contacto com as taças de som surge em 2006...um reencontro que se tornou paixão...e transformou-se em Amor...


 Caminhos interiores com o som… 

O som envolve-nos desde o momento da concepção, o bater do coração da mãe enquanto o feto se desenvolve no útero; o riso da mãe após o parto e a estranheza das vozes de todo os profissionais de saúde. Toda a panóplia de sons numa viagem ao campo (o correr de um regato, o zumbir dos insectos); o mar ao fim do dia, quando já não está ninguém na praia; o giz no quadro da ardósia, enquanto a professora escreve a lição; o tic-tac do relógio numa noite de insónia, os sons do silêncio... Os sons são muitas vezes responsáveis pelos nossos estados emocionais. Quem nunca viu a mãe em estado de desespero ao ouvir o choro da sua criança? Quem nunca se sentiu calmo e relaxado ao ouvir a sua musica favorita sentado no conforto do seu sofá após um cansativo dia de trabalho? Quantos trabalhadores ficam em estado de alerta ao ouvirem a voz do seu chefe atrás da porta do gabinete? E quem nunca teve uma ventania de gargalhadas, daqueles que provocam dores de barriga apenas de ouvir os colegas a rir de uma anedota (mesmo sem a terem percebido)? Quem nunca ouviu falar de surdos que frequentam discotecas para dançar? Vivemos emersos no som desde o primeiro momento e dependemos de tal forma dele que nem nos apercebemos da sua real importância, mas o facto é que o som está sempre presente. Ao sentir o som da sabedoria ancestral, espontaneamente flutuam na minha mente, conceitos como auto-conhecimento, motivação, descoberta, procura, reencontro, partilha, alargamento de fronteiras e áreas limítrofes da percepção cognitivo/sensitiva, enriquecimento do campo intelectual do ponte de vista dos conceitos, um rio que sabe correr, comunicação celular... Se toda criação é vibração e se vibração é som, consequentemente podemos dizer que dentro da criação, no Universo, não pode existir silêncio. Na verdade quando se fala de silêncio neste mundo trata-se apenas de uma condição relativa, é uma vibração condicionada aos limiares da percepção. Por exemplo, uma vibração inferior a 20 e superior a 20.000 ciclos por segundo é silêncio para o ser humano, mas não para outros seres. Assim sendo, o silêncio é uma condição relativa ao limiar de percepção e não uma condição própria do Universo.

Segundo a Medicina Tradicional chinesa, o metal promove estrutura com diferentes níveis de densidade e cria espaço dentro e fora de nós. A patologia surge por estagnação, vazio, excesso de energia ou incapacidade de adaptação. O som das taças tibetanas gongos, parecem restabelecer o suave fluxo da energia e promover adaptação. De uma forma simples, mas não simplista, poderia descrever a forma como sinto o som: Uma árvore com raízes fortes na terra, um tronco que cresce na verticalidade, ramos que expandem e crescem nas diferentes direcções em contacto com os cinco elementos da natureza, folhas, flores que comunicam e frutos saudáveis… sementes que caiem no solo. Um vento suave que movimenta o tronco…por momentos, esse vento aumenta de intensidade, o tronco acompanha esse movimento, e de seguida, volta à posição anterior, agora mais fortalecido. A seiva percorre toda essa árvore, interagindo e transmitindo a informação correcta a cada célula, da mesma forma que cada uma possui toda a informação original. Parafraseando Paramahansa Yogananda o sentir “tranquilamente activo e activamente tranquilo”.


Seguidamente, partilho alguns testemunhos ao longo da minha vivência com o som. Salvaguardando a identidade das pessoas intervenientes, os nomes utilizados não correspondem à realidade. 


UM OLHAR DE CRIANÇA

A M.J é um bebé que neste momento tem aproximadamente um ano e meio, desde sempre, ou seja ainda na barriga da mãe tomou contacto e consciência do som das taças tibetanas particularmente da taça universal. Diversos autores referem-se à audição e ao tacto, do ponto de vista ontogénico, como os primeiros sentidos funcionais, ainda no útero materno.  Por volta dos quatro meses de idade quando regressou à sala de tratamentos, ao ouvir o som da sua taça, reagiu imediatamente, sorrindo direccionou o seu olhar para a taça. De forma regular, mantém contacto com as taças tibetanas e gongos, apresentando desenvolvimento rápido na motricidade fina, expressado na manipulação dos diferentes baguetes, e no toque das taças e gongos. Faz associação de ideias de uma forma fluida e notável, apresenta um discurso acima da média para a idade, é uma criança enérgica, carinhosa e feliz. O som entrou na vida da M.J, e continua a fluir, enquanto mais nova, referia-se a mim como “taaammm”, agora como Paula “Taaammm”. A interacção com o som, permitiu que a M.J me coloca-se ao nível do seu amigo Pateta.


 PARTILHA INTRA E INTER PESSOAL

 Empatia… 

Corria o mês de Maio, quando mais uma vez senti gratidão pelo encontro/reencontro com o som ancestral e pela partilha, comunicação e vivência ao som das taças tibetanas, gongos, shantis e címbalos, com um grupo de bonitas pessoas do distrito de Bragança. Este encontro surgiu no âmbito do programa “Bragança Saudável” de que resultaram mais do que 160 inscrições. Um grupo heterogéneo no que diz respeito à idade, a maior parte proveniente de pequenas aldeias do distrito, com um contexto de vida de grande trabalho, era uma experiência nova para quase todas as pessoas, à excepção de duas pessoas que manifestaram um conhecimento relativo das Taças de som. Com os primeiros sons, tomei consciência de algo comum em todo o grupo, pareciam meninos ao serem tocados pelo som original. Ao mesmo tempo que navegavam num misto de surpresa, encantamento, receio, duvida, recordações, desconfiança, bem-estar, relaxamento, tranquilidade… Na minha mente movimentavam algumas palavras, quase como caminhos a percorrer: adaptação, contemplação, gratidão, como um rio que sabe correr, flexibilidade… Foram vividos dois momentos distintos, o primeiro decorreu no pavilhão desportivo (amplo, sem acústica), pelo que decidimos estender o tapete, proporcionar um banho de som, seguindo-se mini workshop, concerto e colocamos as taças nas mão de cada uma das pessoas para que pudessem sentir o som de uma forma mais próxima. “-Sente-se mesmo!”, “Sinto um formigueiro até ao braço...”, Contagiante era o seu olhar, todo o corpo transmitia encantamento e descoberta: “Sinto-me tal qual rapariga nova...” dizia a Sr.ª Maria, de olhar luzidio no seu rosto já queimado pelo sol, de rugas de sabedoria e experiência.


 O segundo momento decorreu na piscina... seres lindos de fato de banho, touca, sorrisos de orelha a orelha e de mãos dadas, como crianças em passeio de escola. Foram organizados em quatro grupos, mas rapidamente sentiram a necessidade de inter ajuda, para colocar as taças sobre o corpo. Aos primeiros toques da taça, braços e pernas relaxavam, esboçavam um ligeiro sorriso, lábios semi-abertos Durante alguns segundos flutuavam ao som da sabedoria ancestral e sentido por todos, cada vez se tornavam mais leves e flexíveis, inclusive os que inicialmente referiam não conseguirem flutuar sozinhos. Diversas perguntas surgiam na minha mente, tal como as nuvens no céu: que pensamentos, que sentimentos, que emoções, qual o eco dos átomos ao ressoar da vibração da sabedoria original, que tipo de tom era absorvido, que transformações... Um verdadeiro banho de som, todas as moléculas de água daquele espaço, manifestava o reencontro com o mantra OM.

Todos experienciamos, muitos pediam para repetir, até a Sr.ª Antónia, que pese embora, tivesse afirmada de início que não iria experimentar, mas sempre a aconchegar a cervical de todos os colegas durante a partilha, direccionou o olhar para os meus olhos e de uma forma decidida: “Agora é a minha vez...”. Ouvimos desabafos sentidos, como crianças que podem dizer tudo o que sentem e ouvem, pois a sua estrutura de ego, ainda não está completamente desenvolvida, “- Se isto é o céu...quero morrer hoje!”, “-quero levar uma destas panelas para casa!”. As crianças riam, num vai e vem, enérgicas como é saudável na movimentação interna das crianças, “- sinto borboletas na barriga...”. Um dia mágico...na consciência... um banho de sons e emoções, desprovidos de preconceitos para nós e para os meninos de olhar brilhante, a quem manifesto um agradecimento especial por permitirem possível esta experiência.


REFLECTINDO RESILIÊNCIA

Partilho agora uma primeira experiência de massagem de som da Maria, alguém com prática frequente de meditação e yoga, com uma vida profissional de carácter intelectual. Referiu sensação de regresso à infância, à sua visualização, tornara-se bebé, segura e aconchegada nas vibrações de som em forma de ondas que se movimentavam como um acordeão num movimento de flexibilidade, mas ao mesmo tempo de força, sentimento de invulnerabilidade e estrutura Quando me descreveu esta experiência, já tinham passado aproximadamente três dias, mas que ainda sentia, de uma forma mais suave, o seu corpo em vibração e em massagem celular. Por outro lado, atribui a responsabilidade ao som das taças tibetanas, a dissolução de uma situação profissional desagradável e que se vinha a prolongar no tempo “...talvez a minha visão sobre a situação tivesse alterado e de uma forma natural e fluida encontrei a solução...".


 DESABROCHAR...

Percepção de mim/percepção que o outro tem de mim 

Este testemunho provém de uma amiga de há algum tempo em contexto de massagem de som terapêutica. Ao longo da terapia apresentava face serena de lábios semi-abertos, pálpebras encostadas, movimentos oculares involuntários (rapid eye movement, característico da fase mais profunda do sono), movimentos espasticos ligeiros nas pernas, respiração abdominal e lenta; desta forma permaneceu até ao final da massagem. Ao som do Zaphir e dos címbalos, ligando os cabos dos sentidos, regressou ao estado de consciência. Referiu a movimentação energética ascendente, dos pés em movimentos circulares, de abertura e expansão, até ao topo da cabeça, de seguida para os campos mais subtis. “Senti-me como uma flor a abrir!” dizia sorrindo...